O faturamento da Vitamedic com a venda de ivermectina, usada erroneamente no tratamento da covid-19, saltou de R$ 15,7 milhões, em 2019, p...
O faturamento da Vitamedic
com a venda de ivermectina, usada erroneamente no tratamento da covid-19,
saltou de R$ 15,7 milhões, em 2019, para quase R$ 470 milhões no ano passado. O
laboratório deveria ser grato e mandar umas latas de leite condensado a Jair
Bolsonaro, garoto-propaganda do produto. Se foi um trabalho voluntário ou não,
é a CPI da Covid quem deve investigar. O laboratório admitiu que não fez
estudos para atestar a eficácia do produto (originalmente contra sarna, vermes
e piolhos) contra a covid, mas, mesmo assim, gastou R$ 717 mil em anúncios que
defendiam a mentira de que tratamento precoce com ivermectina funciona.
Isso é mais uma evidência de
que a sabotagem perpetrada pelo presidente da República nas medidas de combate
à doença (ridicularizando vacinas, atacando isolamento social, promovendo a
fraude do kit covid) permitiu que muita gente faturasse um bom cascalho. Em
outras palavras, que fizesse da morte em massa um bom negócio.
Em depoimento à CPI da Covid,
nesta quarta (11), Jailton Barbosa, diretor da empresa, reconheceu aumento de
60% no preço do medicamento. Credita a elevação à variação no dólar e ao
crescimento de custos internos relacionados à pandemia. E afirmou que não
vendeu o produto ao Ministério da Saúde, mas despejou diretamente nas
prefeituras.
No final, mesmo com as
desculpas, ficou claro que a empresa sabia estar lucrando em cima de um naco da
população que acredita que o remédio evita mortes. Essa crença levou muita
gente a procurar atendimento médico só quando era tarde demais.
Essa expansão comercial
contou com uma ajudinha. O presidente Jair Bolsonaro atuou
como garoto-propaganda informal do uso do vermífugo da Vitamedic,
recomendando-o em lives e em entrevistas, para o tratamento da covid-19.
O então Ministério da Saúde
do general Eduardo Pazuello chegou a enviar terraplanistas biológicos para
pressionar a Prefeitura de Manaus a distribuir hidroxicloroquina e ivermectina.
E deixou de monitorar um insumo que realmente faria a diferença, o oxigênio.
Com isso, uma catástrofe atingiu a cidade e muitas pessoas morreram sufocadas.
Na esmagadora maioria dos casos,
nosso sistema imunológico é capaz de dar conta da doença, produzindo anticorpos
e eliminando o coronavírus.
Ao apontar um remédio ineficaz como solução para casos leves, o presidente, na
verdade, tenta roubar o mérito por algo que o organismo já faria por conta
própria.
E isso cola em uma parte
desavisada da população. Afinal, o que tem mais a cara de ser responsável por
vencer uma guerra contra uma doença mortal: estruturas microscópicas que cada
um tem dentro de si, os glóbulos brancos, ou um produto milagroso distribuído
com pompa e circunstância pelo sistema de saúde que é alvo de elogios semanais do
presidente em suas lives?
Ah, mas tem os que morrem?
Bem, como o próprio Jair diz sempre, todo mundo morre um dia.
A questão é que a
ivermectina também tem efeitos colaterais, como foi bem lembrado na CPI da
Covid. E pessoas tiveram problemas no fígado por conta do uso de um medicamento
receitado, de forma charlatã, pelo presidente da República. O que levou a um
laboratório a faturar centenas de milhões de reais.
A Sociedade Brasileira de
Infectologia, a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, a Associação
de Medicina Intensiva Brasileira, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) e a Organização Mundial de Saúde (OMS), ou seja, quem representa o
pessoal que está na linha de frente, afirmam que não há tratamento precoce
contra a covid.
Até a Merck,
empresa farmacêutica que produziu inicialmente a ivermectina, divulgou um comunicado
afirmando que seus cientistas procuraram, mas não encontraram evidências que
justificassem o emprego do medicamento no tratamento da covid-19.
Atribui-se a Joseph
Goebbels, ministro da Propaganda na Alemanha nazista, a ideia de que uma
mentira repetida várias vezes se torna verdade. Ou, como dizem os psicólogos,
uma ilusão da verdade. A ilusão é tanto eficaz quanto a propensão de grupos de
nela acreditarem. E, claro, da capacidade de difusão de quem a conta.
Propagada por um presidente
da República, a mentira pode se tornar onipresente. A ponto de ser encarada
como mais um detalhe na paisagem. Assim como a morte, em uma pandemia, em um
país sem governo.

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